sábado, 8 de agosto de 2015

A banda sonora de uma longa marcha



Durante dez meses, semana após semana, embarcou-se numa viagem radiofónica seguindo as coordenadas dos novos territórios da música alternativa feita na Ásia. Sempre à procura da nova música num velho Mundo, em busca de um próximo Oriente. Foi esse o mote para as escolhas musicais que ainda perduram no éter cibernético (as 37 edições de “Próximo Oriente” podem ser escutadas aqui: www.mixcloud.com/proximo_oriente/ ou na página electrónica da Rádio Macau), e assim será na colaboração que agora começa com este jornal.

Frank Zappa disse uma vez que “falar sobre música é como dançar sobre arquitectura”. Parece difícil, mas não será impossível. No entanto, fazendo das palavras do lendário músico um sábio e avisado conselho, serão evitados por aqui demasiados contorcionismos e malabarismos que desviem a atenção do principal: a música.

Para chegar a esse bem essencial propõe-se uma incursão panorâmica aos contextos em que se faz muita da mais excitante música dos nossos dias, trazendo para grande plano os principais actores do que está a acontecer neste nosso próximo Oriente.

Mesmo ao mais incauto dos distraídos não deve passar despercebida a efervescência criativa que alastra em todo o Continente Asiático. Na década que recentemente terminou, foi a armada chinesa de artistas plásticos que impressionou o Mundo, tornando-se a face mais visível de novas gerações de talentos de diferentes expressões. No caso da música, a revolução tem tido menos impacto além fronteiras, mas nem por isso menos força.

Na República Popular, longe vão os dias em que Cui Jian deixou o lugar de trompetista na Orquestra Sinfónica de Pequim para assumir a paternidade do rock no Império do Meio.

Foi em 1989 que Cui lançou aquele que ficou para a história como o primeiro disco de rock gravado na China: “长征路上的摇滚 (“Rock 'N' Roll On The New Long March”). Premonitório e auspicioso título. Como nas inúmeras estatísticas do crescimento económico chinês (que entretanto deixaram de espantar), é sem surpresa que vemos hoje que os últimos 20 anos foram um incessante desfiar do imenso novelo do rock e afins, com a multiplicação de bandas e artistas, não só em Pequim e Xangai, mas também nas restantes províncias.

Um fenómeno que talvez se explique por ter nascido tardio, como se um gigante desperto de um sono milenar tentasse agora com avidez recuperar o passo e o tempo perdidos.

Preservadas as devidas diferenças, há pontos de contacto entre o que acontece actualmente na China e o que acontece noutros países asiáticos que também vivem novas realidades sócio-económicas, como os casos das Filipinas, Indonésia ou Malásia.

À margem desta explosão relativamente recente está o Japão. No contexto regional, o País do Sol Nascente tem já uma longa história de movimentos alternativos aos dominantes produtos massificados das indústrias culturais.

No Japão, é proverbial a calorosa receptividade de que gozam os produtos culturais estrangeiros, mas mais interessante é verificar como as influências são apropriadas, como o “japanese touch” funciona seguindo o princípio de que “nada se perde, nada se cria, tudo se transforma”.

São, portanto, dois os grandes paradigmas que nos guiam à partida para uma viagem rumo ao Próximo Oriente: de um lado, a nova, alternativa e independente China; do outro, o constantemente renovado Japão, país de contrastes profundos, tradicional e moderno, ordeiro e rebelde. No entanto, ambos mais, muito mais, do que se pode dizer numas quantas palavras. Siga a música.

(Publicado no jornal Hoje Macau no dia 11 de Fevereiro de 2011)

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