“There must be a hundred records with voice-overs asking,
“What is house?” The answer is always some greeting card bullshit about “life,
love, happiness”. House is not universal. House is hyper-specific. The contexts
from which the deep house sound emerged are forgotten: sexual and gender
crises, transgendered sex work, black market hormones, drug and alcohol
addiction, loneliness, racism, HIV, ACT-UP, Tompkins Square Park, police
brutality, queer-bashing, underpayment, unemployment and censorship – all at
120 beats per minute.”
“Midtown
120 Intro”, DJ Sprinkles
No magistral “Midtwon 120 Blues”, de 2009, DJ
Sprinkles (alter ego de Terre Thaemlitz, ilustre residente no Japão) oferece um
tratado sobre o “deep house” como música que deve mais ao espírito dos “blues”
do que do “disco”, ou seja, mais à “tristeza” do que à “celebração”, ao mesmo
tempo que recupera aquilo que Thaemlitz considera serem as origens da música
que, nos últimos 20 anos, foi objecto de um raro processo de banalização e
destruição.
Por mais pessoal que seja (e é) a apresentação
que Thaemlitz faz do significado original do “deep house”, há uma ideia que me
parece facilmente acatada de modo mais universal, e que poderá ser transposta
para a restante (boa) música electrónica que é feita para ser ouvida nos (bons)
clubes nocturnos: transgressão.
Sem violações, ou violências, a desobediência
que a boa música propõe diz respeito ao esquecimento de géneros e fronteiras,
de diferenças, convocando todas as partes e mais algumas para pisarem o mesmo
chão a que chamam “pista de dança”, entendido, sobretudo, como um espaço de
liberdade.
Enquanto que os mais fiéis depositários do
espírito original empenham-se com afinco em identificar novos limites para
ultrapassar, os outros (uma maioria omnipresente) comprometem-se a vulgarizar
os já de si lugares mais do que comuns, respondendo, como na epígrafe ali em
cima, com o deslumbramento dos néscios aos mistérios desta vida de festas e de
“gente gira”, de sorrisos fixos, olhares irrequietos e palavras mudas.
Nos últimos tempos, a “discoteca da utopia”
tem sido bem alimentada por um núcleo duro de editoras que lançam discos com a
convicção de missionários: 100 % Silk, Not Not Fun ou Hippos in Tanks são
apenas alguns dos nomes essenciais da nova música electrónica. Como não podia
deixar de ser, o Japão faz parte deste mapa de novas sonoridades, onde há uma
paragem obrigatória em Tóquio: a Diskotopia.
Nascida de um colectivo de DJ, em 2005, a
Diskotopia tornou-se numa editora no final de 2010. Gerida por dois
expatriados, o norte-americano Matt Lyne (A Taut Line) e o britânico Brian Durr
(BD1982), e pela DJ japonesa Am Rhein, a Diskotopia tem um catálogo que, ainda
curto, já prima pelo ecletismo e onde cabem house, techno, sonoridades cósmicas
e hipnagógicas, hi-fi, lo-fi, soul, bass, o novo e o velho, o século XX e os
séculos todos daí em diante.
Na mais recente edição da Diskotopia, o EP “Sketches
of the Other Tokyo”, de Fujimoto Tetsuro, lançado no último mês de Fevereiro,
oferece-se uma nítida visão futurista do passado – hip hop, R&B, jazz, UK
garage, tudo é chamado para esta espécie de “neo-soul” intimista que tem em
Jimmy Edgar guru espiritual, movimentos lentos, mas firmes, e vozes que nos
deixam a impressão de traços da caligrafia japonesa, esguias e sensuais,
recebendo-nos com agrado à entrada da discoteca da utopia. Enjoy, segredam-nos.
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