No ano que agora termina passaram 500 anos
desde o primeiro encontro entre Portugal e a China. Em Macau, onde as duas
histórias se cruzaram, a efeméride passou quase despercebida, sem cerimónias
nem “eventos” oficiais.
Para o bem da sanidade alheia, e até para
preservar a dignidade que resta, foi melhor que os sentimentos patrioteiros de
trazer na lapela tivessem ficado nos armários, tal como também foi melhor que
tivesse sido um “grupo de portugueses” e não um “governo de portugueses” a
juntarem-se num sábado destes de Dezembro, frio e chuvoso, junto à estátua de
Jorge Álvares, o navegador que nos trouxe até aqui.
Cinco séculos depois, a presença portuguesa em
Macau não passa pelas grandes empresas ou pelas grandes marcas, mas sim pelas
pequenas e médias aventuras que raramente vão além dos “comes e bebes”, e que
vão tendo vida cada vez mais difícil, sobretudo porque o “ambiente de negócios”
desta terra só é respirável para magnatas e cadeias internacionais.
A “plataforma” que tanto se ouve, afinal, não
serve para os “sectores estratégicos” portugueses, as finanças, as comunicações
ou quaisquer outros ramos de actividade que, aqui, se dão por satisfeitos com
meros escritórios de representação, consultorias, contactos e uma ou outra “participação”
que apenas servem para alimentar um “estatuto”. Mais grave, a presença
institucional, salvo honrosas excepções, tem sido caracterizada pela discrição
que facilmente se confunde com a tibieza.
É sintomático, também, que 2013 chegue ao fim
com o governo português a apresentar como um êxito a concessão de 471 “vistos
dourados” a cidadãos não-europeus a troco de investirem em Portugal pouco mais
do que 300 milhões de euros, dinheiro gasto principalmente no imobiliário.
Do total dos “vistos gold”, a maioria, 399,
foram parar às mãos de chineses. Como se descreve em Pequim, no jornal Global
Times, ligado ao Partido Comunista Chinês, Portugal “estende passadeira
vermelha aos chineses ricos”. A expressão não podia ser mais exacta.
Em troca da autorização de residência em
Portugal e direito de circulação no espaço Shenghen, exige-se apenas uma de
três coisas: a compra de uma casa de pelo menos meio milhão de euros, o
depósito de um milhão de euros num banco português ou a criação, no mínimo, de
dez postos de trabalho (no início deste ano, quando o programa foi apresentado
aqui em Macau exigia-se pelo menos 30).
De acordo com rádio pública portuguesa, a
Antena 1, o Ministério Público, a Polícia Judiciária, os Serviços de
Estrangeiros e Fronteiras e o Serviço de Informações e Segurança (a “secreta”
portuguesa que, de resto, lamenta não ter sido chamada a acompanhar este
processo) manifestam todos preocupações quanto ao eventual aproveitamento do
programa de “vistos dourados” para a lavagem de dinheiro.
Mas nem isso nem estender passadeiras
vermelhas incomoda por aí além ou desvia os decididos governantes portugueses
de conseguirem “mais valias inequívocas para a economia”. Continuam a ter por
desígnio abanar a “árvore das patacas”. Passado todo este tempo.
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