sábado, 8 de agosto de 2015

Passo a passo


Quando surgiu, no início da década de 1990, a expressão “IDM” (Intelligent dance music) procurava distinguir o tipo de música electrónica que não se limitava à justificação funcional das pistas de dança e que se desviava por caminhos mais dados à experimentação, o que resultava (muitas vezes) em arritmias que não se harmonizavam com pés que queriam bater a noite toda sem parar.

Amaldiçoada tanto pelos artistas que descrevia como pelos que excluía (deixados a pensar que faziam “stupid dance music”), a denominação “IDM” sobreviveu para apresentar música que continua a perder-se no labirinto da electrónica e que depois se encontra aninhada nos circuitos cerebrais dos ouvintes.

Desde que, em 1992, a Warp Records lançou a compilação “Artificial Intelligence”, anunciando ao mundo os artistas que viriam a ser considerados os mestres da IDM (Autechre, Aphex Twin, B12, The Black Dog e The Orb), foram imensas as ramificações que a música electrónica gerou, e o caminho que então começou a ser desbravado continua sem fim à vista.

Com o tempo, naturalmente, esbateu-se a distinção entre a IDM e o resto da electrónica, o que resultou, entre outras coisas, numa música de dança menos convencional, ainda que igualmente funcional.

Actualmente, entre os géneros que não se conformam ao padrão rítmico mais comum da música electrónica, “four-to-the-floor”, o mais popular é talvez o Dubstep.

Com origem em Londres, descendente bastardo do Dub, Grime, 2-Step, UK Garage e do Drum and Bass, o Dubstep consiste, em traços gerais, no diálogo de linhas de baixo ultra saturadas que estremecem o espaço entre percussões narcóticas, quebradas e irregulares, com tímidos esquissos de melodias e poucas ou nenhumas vocalizações. É este o som que se ouve, como fundo, em “The Other Side”, o disco de estreia de Achun, produtor de Macau.

Editado este ano pela Pause Music, editora da Xangai, “On the Other Side” convoca o Dubstep como influência notória, mas usa-o como tapete sobre o qual se estendem outras sonoridades, do 8-Bit (“Chiptune”, remanescente dos primórdios da cultura de videojogos) ao Breakbeat, passando pelo Electro. Aliado à música, surge um imaginário que Achun reclama dos filmes de ficção científica e de teorias da conspiração, que terão dado o mote para o tema de abertura do disco, “Hidden Fear”, que entrecruza Electro e Dubstep num clima de tensão que só a espaços, ao longo do disco, desaparece.

De produção consistente e bem artilhada, “On the Other Side” tem como momentos altos “Stargate” (devidamente espacial, trazendo ao disco uma profundidade de som que falta a outros temas, ajudando a projectar a música para outra dimensão) e “Scenario”, o tema de maior fidelidade à raiz mais profunda do Dubstep, o Dub.

Apesar de só este ano se ter aventurado na edição, Achun tem actividade como produtor desde 2003. O tempo que esperou até lançar “On the Other Side”, entre outras coisas, revela que, como o próprio Achun confessa, “não é fácil ser produtor de música em Macau”, nem tão pouco ser um mero apreciador de música electrónica.

Depois de concertos na China e em Hong Kong, no próximo dia 28 de Julho, Achun apresenta “On the Other Side” em Macau, no Armazém do Boi. Além de ser uma oportunidade para ouvir, em avanço, alguns dos temas do próximo EP, com edição agendada para o final de 2012, o concerto servirá, também, para tomar o pulso ao movimento local em torno do Dubstep e da música electrónica, que chegou a ter expressão quando o bar Blue Frog abria as portas a noites temáticas. E agora?

“On the Other Side” 
Achun
Pause Music, 2012

Publicado no jornal Hoje Macau no dia 22 de Junho de 2012


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