Hoje, dia 30 de Março, o Museu do Oriente, em
Lisboa, é o palco da apresentação oficial do segundo volume do projecto
T(h)ree, a aventura do produtor David Valentim que volta a juntar músicos
portugueses e asiáticos. No primeiro volume, editado em 2010 e, depois, no ano
passado, o triângulo foi formado por Portugal, Macau e Hong Kong. Neste segundo
disco, as duas regiões chinesas dão lugar a Singapura e às Filipinas.
Pensado como uma trilogia, T(h)ree conta, até
agora, com o envolvimento de mais de 150 músicos dos dois lados do globo, sendo
que a maioria (para não dizer todos) não se conhecia antes desta iniciativa
pioneira.
Mesmo apesar do desconhecimento (trabalharam
em conjunto uns com os outros através da Internet), todos os artistas presentes
nas duas compilações demonstraram, desde o primeiro momento, uma adesão e
entusiasmo assinaláveis, e foram os primeiros a perceber o potencial deste
projecto que, dois anos após o lançamento inicial (a primeira edição de um disco
T(h)ree remonta a 2010, em Macau), continua a não ter par no mundo inteiro.
Vale a pena recordar algumas das parelhas bem sucedidas que o instinto do produtor David Valentim orquestrou no primeiro disco: os portugueses A Naifa com Winnie Lau, de Hong Kong; os portugueses Hipnótica com os Unixx, de Hong Kong; ou o português Kubik com os Evade, de Macau.
Sem surpresa, o recente disco lançado no
passado dia 26 de Março oferece mais umas quantas excelentes e improváveis
parcerias, com destaque para os portugueses Pop Dell'a Arte com os filipinos
The Dorques, os portugueses Stealing Orchestra e Maze com os singapurenses The
Analog Girl, ou o violinista português Carlos Zíngaro com os Life Without
Dreams, de Singapura.
Pode dizer-se que a fórmula repete-se, mas
neste caso isso não significa que as ideias tenham estagnado, antes pelo
contrário. O segundo volume de T(h)ree avança por caminhos diferentes daqueles
trilhados no primeiro, uma tendência que deverá ser aprofundada no terceiro
disco (já em fase de produção), e para a qual contribui a boa e saudável dose
de imponderabilidade própria de um conceito que se baseia em juntar artistas de
realidades tão distintas.
Nas palavras de David Valentim, “Singapura e
Filipinas são dois lugares antónimos na Ásia”. Temos, assim, por um lado,
Singapura, local de estabilidade económica, boas infra-estruturas, harmonia
social e baixíssimos níveis de criminalidade. “Lugar de um consumismo extremo
onde o verdadeiro desafio diário é criar um equilíbrio entre avassaladora e competitiva
vida profissional e a necessária vida pessoal de qualquer ser humano.” Neste
aspecto, nota David Valentim, em Singapura, “há uma questão por resolver: qual
a verdadeira identidade de uma cidade-estado com tanta multiplicidade cultural?
Como criar uma identidade própria a partir de tantas outras sem que nenhuma
saia prejudicada?” Diz o produtor que “a música não escapa a essa procura de
identidade.” Assim, “há um movimento ‘experimental’ na cena musical local que
tenta explorar novos caminhos.”
No que diz respeito às Filipinas, sobretudo
Manila, pode dizer-se que se trata de “um paradigma de sociedade caótica,
sufocante, pobre, quase tribal em alguns aspectos. Quase tudo funciona mal nas
Filipinas, mas o encanto é mesmo esse: perceber como se produz cultura num
local onde é tão difícil ter qualidade de vida, mas que ao mesmo tempo oferece
uma história tão rica quanto antiga (ao contrário de Singapura)”.
Acrescenta o produtor que, no caso da música
feita nas Filipinas, toda esta realidade surge reflectida “na forma como o lado
étnico e ‘folk’ está presente no panorama local”, que fica completo com uma
vasta diversidade que vai desde o Rock ao Hip-Hop. Esta mistura de géneros
modernos e as influências étnicas pode ser comprovada na colaboração entre os portugueses
Blasted Mechanism e a banda ‘folk’ Toi, de Manila.
Enquanto produtor, David Valentim diz ter
procurado “as bandas que melhor representam a música feita actualmente nos três
territórios, e sobretudo aquelas pelas quais nutro um elevado gosto pessoal”.
Além de ter escolhido os músicos e as bandas,
David Valentim encarregou-se de que o disco tomasse uma forma coerente,
instruindo os artistas das indicações directas do que pretendia. Como o próprio
diz, “sou um pouco a pessoa que coloca as peças do puzzle e faz com que tudo
bata certo”.
Para que tudo fizesse (ainda mais) sentido, os
discos do projecto deveriam ser complementados com um evento anual pensado como
um festival. David Valentim já tem o nome e o lugar: T(h)ree Bridges, em Macau.
A ideia consiste em juntar no mesmo palco músicos portugueses e asiáticos. Que
melhor lugar do que Macau?
Na cabeça de David Valentim, o projecto deste
festival tem, pelo menos, 4 anos. Já bateu a várias portas e várias vezes o
deixaram sem resposta.
Não é despropositado lembrar que T(h)ree não é
subsídio-dependente, porque, como David Valentim diz, “com ou sem apoios, os
álbuns são lançados, mesmo que no fim tenha que ser o produtor a pagar os seus
custos.”
No entanto, transpor a aventura dos discos
para os palcos é uma empresa que carece de apoios e que deveria suscitar o
interesse generalizado. Além da música, T(h)ree celebra o famigerado diálogo
inter-cultural que, aqui em Macau, serve para tudo e mais alguma coisa. Oxalá
não tarde muito até que este projecto único tenha o palco que merece.
Publicado no jornal Hoje Macau no dia 30 de Março de 2012
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